- Paulo Lídio
Manto e Adaga – 1ª Temporada | Crítica: Um show de referências e conexões
No vasto leque de opções que a Marvel disponibiliza aos seus fãs, uma delas chegou quieta e sem alarde. Para 2018, a casa das ideias anunciou a produção de Manto e Adaga, personagens nível B (ou até mesmo C) nas histórias em quadrinhos da editora. Produzida pelo estúdio ABC Family e distribuída pelo canal Freeform, o seriado aposta na fórmula usada em Fugitivos, cujo trabalho é voltado para adolescentes e seus problemas contemporâneos, sem deixar de lado, é claro, o aspecto heroico deles. Mas antes de destrinchar a série, vamos explicar quem são Manto e Adaga nos quadrinhos. Afinal de contas, nem todo mundo é obrigado a conhecer sobre HQs. Porém, conhecimento sempre é válido.
Manto e Adaga foram criados no ano de 1982 pelo ilustrador Ed Hanningan, que narrava a história de dois adolescentes que fogem de Nova Iorque em busca de uma vida melhor, mas não contavam que fossem ganhar poderes especiais. Tyrone Johnson (Manto) é um jovem de um dos bairros mais pobres de Massachusetts. Depois do falecimento de seu melhor amigo, ele entra em depressão e vai morar nas ruas, onde acaba indo para a criminalidade para sobreviver. Sua parceira, Tandy Bowen (Adaga), possui uma origem totalmente oposta. Também nascida em Ohio, a jovem vem de uma família rica, onde ainda muito jovem foi abandonada pelo pai e devido a isso criada pela mãe. O abandono segue acompanhando a adolescente, que acaba sendo deixada também pelas pessoas ao seu redor, o que a leva à decisão de ir para Nova Iorque a procura de realizar o seu sonho de infância: tornar-se uma dançarina profissional. No entanto, o que eles não imaginavam é que suas vidas iriam mudar após obterem poderes, que, por sua vez, geraria uma conexão fortíssima, tanto a nível de habilidades, quanto emocional.
Isto posto, devemos ressaltar que a adaptação em live-action optou por mudar a origem dos personagens, dando início a história em Nova Orleans. Tyrone Johnson (interpretado pelo ator Aubrey Joseph) vem de uma família de classe média. Porém, vê sua vida ruir após presenciar o assassinato de seu irmão mais velho nas mãos de um policial corrupto, o que está diretamente ligado a forma como ganhou seus poderes. Tandy Bowen (interpretada pela atriz Olivia Holt) perdeu o pai num acidente automobilístico quando criança, o que também está ligado a forma como adquiriu suas habilidades. Na série, ela não possui um bom relacionamento com sua mãe, e por isso adota um estilo de vida alternativo, morando numa igreja abandonada e praticando pequenos delitos para sobreviver sem a ajuda de ninguém. Essas mudanças tornam-se positivas, uma vez que nos dias atuais as coisas mudaram e muitos estereótipos de antigamente caíram.
A sacada da série é mostrar que um jovem negro de classe média não precisa ser um criminoso, no entanto é interessante como ela expõe como o racismo é algo tão imposto na sociedade. Não importa o status social de Tyrone perante a polícia, ele segue apenas como um negro na sua cidade tendo que superar uma barreira por dia a procura de respeito. Fato este que se repete quando Tandy explica que não importa sua origem, as escolhas feitas na sua vida terão um resultado futuro. Não importa se ela é filha de um cientista famoso, loira e outros estereótipos padrões, cabe a ela decidir o que fazer para mudar sua realidade. Num tempo onde estão em evidência manifestações em combate a violência policial contra negros e pobres nos Estados Unidos, sobrou ousadia do seriado em abordar uma temática tão polêmica e necessária.
O maior ponto de Manto e Adaga fica por conta do “excesso de referências” ao MCU e às demais séries da Marvel. Obviamente que nesta crítica evitamos o máximo possível de spoilers, mas devemos dar os parabéns aos showrunners por não apenas jogarem coisas vazias no ar, como as séries da Netflix fazem. A nível de curiosidade ou caso você não percebe, saiba que irá encontrar referências de Punho de Ferro, Vingadores, Agente Carter, dentre outras. Outro ponto positivo a ser destacado fica por conta do elenco de apoio, que apesar de não ter nenhuma atuação ou papel que roube a cena, sabe levar muito bem a história. Inclusive, um deles faz toda a conexão com o universo de séries da Marvel, além de deixar o gancho principal para a segunda temporada (já confirmada pela empresa). Apesar de não termos um vilão memorável ou muito bem desenvolvido, as ameaças principais aos heróis são satisfatórias, dando sequência à trama e mostrando que podem se desenrolar melhor no segundo ano do seriado.
Por se tratar de uma série com história de origem, é comum sentir o ritmo oscilar bastante. E em razão de serem heróis não tão conhecidos do público, permite-se que os produtores e diretores tenham maior liberdade nas decisões, o que se torna algo positivo. A maneira como a conexão dos personagens com sua terra natal é explorada passa a ser um atrativo a parte, visto que cada núcleo possui uma explicação para a origem de seus poderes. As causas são muito bem explicadas, desde religiões africanas nos Estados Unidos, até a desastres químicos provocados por empresas gananciosas. A trilha sonora contribui também ao facilitar a identificação dos personagens, com uso e abuso do pop e, principalmente, do hip hop, mas nada memorável como em outras produções da própria Marvel. E apesar de ser uma série que trabalha muito bem com referências, podemos com certeza tirar o nosso cavalinho da chuva, já que tão cedo não devemos ver os trajes dos quadrinhos na série em virtude das dificuldades de adaptação. A computação gráfica acaba sendo a mais básica possível, o que é compreensível por ser uma temporada de estreia e o orçamento mais reduzido, mas nada que influencie a experiência final.
A experiência da Marvel ligada diretamente ao público adolescente provou-se um sucesso com Fugitivos, e agora, dá sequência com Manto e Adaga. Resta saber se as conexões vão além com a inclusão de crossovers, embora não seja obrigatório. O universo estabelecido por Manto e Adaga conseguiu se segurar por si só, gerando uma boa expectativa para a próxima temporada.
Nota: 4 / 5
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